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É grave a situação de Boqueirão. E medidas urgentes são fundamentais para que aquele açude não entre em colapso e deixe 1 milhão de pessoas com sede no estado da Paraíba. Esta é, em síntese, a conclusão a que chegaram os participantes da audiência pública requerida pelos três senadores Cássio Cunha Lima e Cícero Lucena (ambos PSDB) e Vital do Rêgo Filho (PMDB), ocorrida na Comissão de Desenvolvimento Regional e Turismo (CDR), na manhã desta quarta-feira (27).
O açude Epitácio Pessoa, mais conhecido como Boqueirão, é responsável pelo abastecimento de Campina Grande e outros 19 municípios paraibanos como e foi construído pelo Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs) na década de 1950. Atualmente atende mais de um milhão de pessoas. O último transbordamento do manancial foi registrado em 2011, de acordo com a Agência Nacional de Águas (ANA).
BAIXO NÍVEL – Segundo a Agência Executiva de Gestão das Águas do Estado da Paraíba (AESA), que monitora os níveis do reservatório, o volume atual é de 163.143.287 m³ de água, ou seja, 39,6% da capacidade total, que é 411.686.287 m³. O baixo nível persiste, mesmo após o Boqueirão ter recebido aproximadamente dois milhões de m³ de água, algo equivalente a sete centímetros de sua lâmina, provenientes das chuvas caídas na região.
De acordo com os expositores presentes, o açude do Boqueirão está com 39,6% do seu volume e chegará a seu volume morto, ou seja, ao volume indisponível para captação de água, se não chover, em janeiro de 2015. Em outras palavras, a situação do semiárido nunca foi tão grave, devido à rigorosa seca e à má gestão dos recursos hídricos. Senadores e convidados ressaltaram a importância da transposição do rio São Francisco, que dará segurança hídrica a todo o semiárido nordestino.
SECA – Segundo o diretor-presidente da Agência Nacional de Águas, Vicente Andreu Guillo, estima-se que a seca atual é a pior entre 30 e 50 anos no semiárido nordestino. Ele afirmou ainda que o registro de precipitação é o pior nos últimos cem anos. Para Guillo, outra causa da situação alarmante que vive a região é o fato de o país ter um nível de reservação de água muito pequeno.
– O Brasil tem, de maneira geral, uma grande fragilidade em termos de reservação hídrica. Nós estamos defendendo a retomada de uma política de construção de grandes reservatórios neste país – afirmou o diretor da ANA.
O presidente da ANA explicou ainda que o nível de reservação de água na Paraíba está em torno de 30% e grande parte desse volume se deve ao açude do Boqueirão. “Se nós retirarmos desses 30% o reservatório de Boqueirão, que está próximo de 40% e tem um grande volume, a média da Paraíba baixaria drasticamente” – afirmou.
“E SE?” – O senador Cássio Cunha Lima não floreou e foi direto ao ponto: exigiu que a ANA tome uma atitude emergencial para o caso de não chover nos próximos meses. “São necessários planos de contingência, para que possamos estar preparados para o pior. E se não chover, o que faremos? Não podemos deixar chegar janeiro, não podemos é deixar chegar o colapso completo para depois decidir o que será feito – afirmou Cássio, indignado.
Cássio lembrou que participou de debates, na Paraíba, sobre o problema do açude, sobretudo na coordenação do trabalho “muito dedicado e inteligente do deputado Assis Quintans, em nome da Assembleia Legislativa do estado”. De fato, Quintans é um parlamentar cuja atuação é fortemente comprometida com a questão de convivência com a seca. O senador paraibano também ressaltou que a atuação do presidente da Federação das Indústrias, Buega Gadelha, e a preocupação constante da prefeitura de Campina Grande, representada, na audiência, pelo secretário e vereador Tovar Correia Lima.
Coremas – Mãe D`Água e Engenheiro Ávidos – Cássio lembrou ainda que “não podemos nos esquecer de outro Boqueirão, que é Engenheiro Ávidos, que abastece a cidade de Cajazeiras, e da própria situação do Açude Coremas. Todos eles são mananciais federais e que, portanto, dependem da gestão da Agência Nacional de Águas”. O problema é que, além da seca, os problemas enfrentados por cerca de um milhão de pessoas que vivem nos municípios dependentes dos açudes também são causados pelo desperdício de água, má gestão e presença de irrigantes que usam a água do açude sem outorga para tal e sem fiscalização.
O presidente da ANA disse que a agência está fazendo um acordo com os irrigantes para diminuir a captação de água e desenvolvendo um trabalho em parceria com a Agência Executiva de Gestão das Águas do Estado da Paraíba (Aesa), o Departamento Nacional de Obras contra a Seca (Dnocs), o Ministério Público e a Companhia de Água e Esgotos da Paraíba (Cagepa) para melhorar a gestão da água.
MÁ GESTÃO – De acordo com o professor da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), Janiro Costa Rêgo, o principal problema causador da falta de água no açude é a má gestão. Ele explicou que, segundo a Lei de Águas (Lei 9433/1997), as bacias hidrográficas interestaduais e os reservatórios de águas federais devem ser geridos pela União, ou seja, pela ANA. Por sua vez, as bacias hidrográficas estaduais, devem ser geridas pelo estado. No entanto, o açude do Boqueirão, embora seja um reservatório de águas federais, faz parte de uma bacia hidrográfica estadual, que é a Bacia Hidrográfica do rio Paraíba.
– Isso leva a uma complicação na gestão – afirmou o professor, que sugeriu uma delegação da gestão do açude à Aesa.
O presidente da Aesa, João Vicente Machado Sobrinho, ressaltou o trabalho que tem sido feito em parceria com a ANA, que, segundo ele, está praticamente “morando” na Paraíba. Ele se comprometeu em continuar fazendo as reuniões periódicas, permanentemente, com a agência nacional para monitorar a gestão da água no estado.
– Chova ou não chova, nós vamos continuar com essas reuniões periódicas permanentemente, com a frequência de dois, três meses, analisando o que se está fazendo, verificando como se está gerindo – comprometeu-se Sobrinho.
TRANSPOSIÇÃO – Unanimidade durante a audiência pública, as obras da transposição do rio São Francisco foram lembradas como de importância estratégica para a convivência com a seca no Nordeste brasileiro. O presidente da Federação das Indústrias da Paraíba, Buega Gadelha, foi ao ponto: “Sem a transposição do rio São Francisco, a Paraíba não tem futuro”.
Mas a calamidade total pode acontecer antes, se não houver chuva ou solução para o esvaziamento do açude Epitácio Pessoa. Por isto, a CDR apresentou requerimento para a realização de uma reunião com representantes do governo da Paraíba, na sede da Agência Nacional de Águas (ANA), a fim de buscar uma solução de emergência para a situação de falta de abastecimento de água enfrentada por vários municípios do sertão paraibano. O requerimento foi aprovado logo após a audiência pública. Agora é aguardar os próximos capítulos.
Com De olho no Cariri