A emergência da agenda conservadora no Brasil deve ser compreendida a partir da confluência de um conjunto de causas, a começar pelos erros políticos dos governos petistas, que, exitosos no enfrentamento às urgências da fome, do desemprego e da destruição do Estado brasileiro pelos neoliberais, não soube construir a narrativa, o discurso com as classes populares que ascenderam econômica e socialmente na última década.
Essa classe trabalhadora que subiu na vida, que melhorou de vida, claro com muito trabalho e esforço pessoal, mas que, como assinala o sociólogo polonês Zygmut Bauman, só conseguiu tal proeza numa conjuntura favorável construída por um governo progressista, agora se volta contra a política e contra esse governo que lhes ofereceu “a escada” com os degraus que permitiu tal ascensão.
Os governos de Lula e Dilma, não cuidaram de contar essa história. O PT também não. O PT, aliás, contribuiu para a crise política ao cometer os erros que seus adversários na grande mídia e nos demais partidos tanto queriam: adotar as mesmas diabruras e ficar eticamente parecido com aquilo que tanto combateu.
Enfim, na crise, as forças conservadoras saíram da toca, botaram a cara, ganharam muitos votos, avançaram sobre o Congresso Nacional e agora pautam uma agenda conservadora que estava interditada: O Projeto de Lei 4330 /2004, da ampla Terceirização do trabalho, que já passou pela Câmara dos Deputados; a PEC 215/2000, projeto de emenda constitucional que propõe transferir do poder executivo para o parlamento a competência para a demarcação das terras indígenas; a PEC 171/1993 que pretende reduzir a maioridade penal; o Projeto de Lei 3722/2012 que pretende alterar o Estatuto do Desarmamento para facilitar o acesso legal às armas de fogo.
Na contramão, ficaram bem mais difíceis as lutas progressistas pela descriminalização das drogas, descriminalização do aborto, regulamentação da mídia, desmilitarização da segurança pública, criminalização da homofobia. Avulta e avança principalmente na Câmara dos Deputados, o obscurantismo e o fundamentalismo muito bem representados pelo presidente da Casa, o deputado plutocrata Eduardo Cunha (PMDB).
A corrupção, questão grave e secular do país, e a estagnação econômica a partir de 2014 completam o cenário que as forças da Reação tanto queriam para retomar a iniciativa política no país. Tudo isso fomentado por uma mídia que sempre toma partido e é porta-voz de um projeto elitista de país.
As iniciativas do governo federal e dos partidos políticos reformistas, principalmente o PT, ainda são tímidas para enfrentar a agenda negativa pautada pelas forças mais conservadoras do Brasil. A presidenta Dilma, emudecida, parece apostar todas as fichas na retomada do crescimento econômico ancorado nas medidas de ajuste fiscal, na recuperação da Petrobras e nas parcerias público-privadas para obras estruturantes. O Partido dos Trabalhadores está seriamente avariado e sob o risco de se tornar o espelho quebrado (e irrecuperável) da política à esquerda.
O nosso PT reage atacando os adversários de terem cometido antes a corrupção com o que figuras do partido se envolveriam. O PT, por enquanto se refugia na proteção do resiliente “lulismo” que paira na consciência de uma grande parcela do povo brasileiro. Isto não basta para tirar “das cordas” o partido que enfrentou as maiores urgências da agenda nacional.
Mas não é só o PT que está sendo atacado. Todas as conquistas e toda a agenda reformista por vir estão ameaçadas, nem bem começamos a fazer, ainda que tardias, as mudanças na sociedade brasileira. As forças políticas progressistas estão na defensiva e precisam se articular em toda a sua diversidade, para enfrentar os ataques que estão em curso.
Uma importante iniciativa da chamada sociedade civil está unindo diversas forças vivas na luta para resistir e para avançar: a Coalizão para a Reforma Política Democrática e Eleições Limpas, formada por inúmeras instituições, a exemplo da CNBB, OAB, CUT, Contag, UNE, Plataforma, MCCE, CTB.
Essa Coalizão mostra que importantes forças da sociedade estão reagindo para mobilizar amplos setores da população e para interferir nos rumos do embate institucional, em defesa de mais mudanças e não de retrocessos. Mas, os partidos políticos à esquerda, mesmo com o grande desgaste, devem apostar na agenda básica para a construção da unidade necessária à retomada da iniciativa política nacional.
Em tempo: A presidenta, legitimamente reeleita, Dilma Rousseff precisa se encontrar com a política, com as forças populares e democráticas que se uniram pela sua reeleição no segundo turno. É preciso ir além da gestão e fazer política. O fazer política não pode ser terceirizado.
Por Zizo Mamede